"Onde queres revólver, sou coqueiro
Onde queres dinheiro, sou paixão
Onde queres descanso, sou desejo
E onde sou só desejo, queres não
E onde não queres nada, nada falta
E onde voas bem alto, eu sou o chão
E onde pisas no chão, minha alma salta
e ganha liberdade na amplidão...
Onde queres família, sou maluco
E onde queres romântico, burguês
Onde queres leblon, sou pernambuco
E onde queres eunuco, garanhão
E onde queres o sim e o não, talvez
Onde vês, eu não vislumbro razão
Onde queres o lobo, eu sou o irmão
E onde queres cowboy, eu sou chinês
Ah, bruta flor do querer...
Ah, bruta flor, bruta flor
Onde queres o ato, eu sou o espírito
E onde queres ternura, eu sou tesão
Onde queres o livre, decassílabo
E onde buscas o anjo, eu sou mulher
Onde queres prazer, sou o que dói
E onde queres tortura, mansidão
Onde queres o lar, revolução
E onde queres bandido, eu sou o herói
Eu queria querer-te amar o amor,
Construírmos dulcíssima prisão
E encontrar a mais justa adequação
Tudo métrica e rima e nunca dor
Mas a vida é real e é de viés,
E vê só que cilada o amor me armou
Eu te quero e não me queres como sou
Não te quero e não me queres como és...
Ah, bruta flor do querer...
Ah, bruta flor, bruta flor
Onde queres comício, flipper vídeo
E onde queres romance, rock'n roll
Onde queres a lua, eu sou o sol
Onde a pura-natura, o inseticídeo
E onde queres mistério, eu sou a luz
Onde queres um canto, o mundo inteiro
Onde queres quaresma, fevereiro
E onde queres coqueiro, eu sou obus
O quereres e o estares sempre a fim,
Do que em mim é em ti tão desigual...
Faz-me querer-te bem, querer-te mal
Bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente impessoal
E eu querendo querer-te sem ter fim
E querendo-te, aprender o total
do querer que há
E do que não há em mim"
Caetano Veloso
13 junho, 2008
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